Cinzento
Acordo, "puta que o pariu...hoje não", atrasado de novo... Foda-se... ninguém vai ligar se eu atrasar.
Celular: "Caio! Caralho! Cadê você?! Você está, exatamente, 13 minutos atrasado! E não me fala que você acabou de acordar!"
Claro que não, eu tava fudendo sua mãe enquanto seu pai olhava...
Durmo encostado na parede enquanto mijo, adoro fazer isso, dá uma sensação de estranha contravensão. Vou até a pia, olho no espelho... "O que é essa porra cinzenta que acorda todo dia e faz tudo sempre igual? Uma coincidência dos infernos... um merda de um teleguiado". Durmo de novo enquanto escovo os dentes.
Ligo o rádio enquanto me troco, "Pump it! Pump it!", a mesmice de todas as coisas... Calça jeans bége, camiseta laranja-desbotada, camisa bége, agasalho verde-musgo, cachecol preto e boné preto, quero passar desapercebido na multidão. Algo bem fácil de se fazer...
Me escondendo de cada olhar ligo o discman no talo, "please die ana", dia cinzento, mundo cinzento. Todas mentes embaçadas pela fuligem do cotidiano, e hoje sou mais um na multidão. "Open fiiire!", o metrô tá uma merda, pára a cada cinco minutos no meio de um túnel sempre. Uma senhora fica passando o braço dela no meu pescoço, braço enrugado, cheio de pelos oleósos. Um bebê começa a chorar do outro lado do vagão, um senhor tosse profusamente em um lenço amarelado de doenças velhas, um casal se beija do meu lado, língua, baba e gemidos baixinhos que só eu escuto. "Heyyy it's over! I'm freak!"
No serviço dou um falso "bom dia" pra secretária, ela grunhe de volta, "tenho certeza de que ela é um zumbi" comento comigo mesmo... "Bom dia, senhores" cumprimento meus colegas e chefes... Outros grunhidos.
Sento na minha baia, o teclado é um convite ao desespero, o monitor um convite à solidão, a janela um convite a... mudanças... Quem sabe? "Não, muito barulho", penso, a última coisa que quero hoje é que alguém me perceba. Crianças em excursão pela redação passam pelas baias, riem, fazem careta, apontam e jogam alguns amendoins. "Don't feed the animals! You motherfuckers", ninguém lê os avisos.
O dia passa... passa... não sinto os ventos da mudança, o mundo continua cinzento e os sorrisos embaçados. O dia pode acabar agora, mas aí, vai saber se já não acabou e eu continuo nessa inércia aconchegante, igual ao resto do mundo?
você ama?
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postado por caio teixeira às 2:19 PM |