segunda-feira, 13 de agosto de 2007


Cavadores (parte 2 de 5)


Depois de Patty foi tudo mais rápido. Caminhávamos em direção ao centro de Cu Chi, parecia que estávamos indo para o centro de um vespeiro. Eles surgiam de todos os lados, de noite não dava para dormir, você escutava eles conversando, eles nos farejavam, sabe? Ronny e Júnior foram os próximos. Os mataram enquanto tentávamos dormir. Esses ninguém viu. Aposto que os dois ainda não perceberam que estão mortos. Acordei com Lee gritando. Ronny tinha sido degolado e Júnior foi estripado. Lee gritava sem parar, tive de faze-lo parar. O acertei um murro bem no meio do nariz, o coitado usava óculos. Parti a lente do olho direito dele e um caco de vidro furou o olho dele. Deve ter doído pra cacete, mas eu odeio gente gritando. Depois disso chamávamos Lee de “Barba-Ruiva, o Pirata”. Pelo menos ele ria.

Estávamos há uma semana em Cu Chi e não encontramos nenhum vestígio do nosso exército. Eu já estava ficando preocupado, os mantimentos acabavam. Os nossos pés estavam piorando, eu já estava dando nome aos vermes que rastejavam na minha sola. Lee estava piorando, o olho infeccionado e a pressão dos Charlies estavam deixando ele “nervoso”. Bobby foi o quarto a ser atingido pelos pequenos diabinhos. Mas a morte dele não foi em vão. Vimos de onde o maldito Charlie saiu, aliás, ele brotou do chão. Antes de Bobby cair com o maior terceiro olho que já vi eu entendi como eles faziam para aparecer e sumir tão rápido. Lee atingiu o assassino de Bobby, mas isso não fez bem ao estado do pequeno Pirata. Ele surtou.

Sabe, durante nossa estadia no Vietnã fizemos muitas coisas das quais não nos orgulhamos muito. Para você não tem problema contar, afinal, os milicos que te indicaram. Matamos, muitos, matamos famílias. Estupramos mulheres, crianças. Mas não era nada como mostram nos filmes, surubas homéricas regadas a chuva de lama e cheiro de pólvora. Ninguém resistia, as mulheres nos viam e já tiravam a roupa, a filhinhas já chegavam querendo tirar o seu cinto. Aquele povo queria sobreviver, não importava como. As mulheres trepavam pela vida, os homens cavavam. E como cavavam. Entendemos isso em Cu Chi.

Depois que Bobby e seu assassino caíram eu vi o buraco, aliás, dois buracos. Um no chão e outro que Lee fez no céu da boca. Eu nem vi direito quando ele puxou sua 9 milímetros e colocou o cano dentro da própria boca. O outro buraco, o túnel, que os desgraçados usavam para aparecer e desaparecer. É como um ponto azul em meio a um mundaréu de pontos amarelos, é difícil de achar, mas depois que você o vê não tem como não enxergar outros. A cada dez, cinco metros, apareciam outras entradas. Os filhos de uma cadela cavaram em todo o canto! Caralho! Todo o país era um emaranhado de túneis! Túneis que levavam para lagos, túneis que levavam para cidades, túneis que levavam para outros túneis! Eles não pararam de cavar um só segundo durante a guerra, ou até antes dela!


Tomei a decisão de entrar, queria saber, queria ver onde os cornos estavam se escondendo, sabe? Eu estava de saco cheio de toda aquela merda! Queria voltar para casa. Queria comprar meu Cadilac Rabo de Peixe Verde-Água. Inferno! Queria trepar com uma boa americana! Entrei e levei o que restava do meu batalhão comigo: Rodriguez e Stu.


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postado por caio teixeira às 1:50 AM |

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