Guerra (parte 1 de 4)
"Um... Dois... Três..." e tudo pára. Não é um slowmotion de filme. O mundo realmente pára, se curva para você. O centro da Terra, a célula revoltosa e cancerígena em meio à sociedade.
Todos do vagão sentem que algo irá acontecer. Você levanta, devagar, o balançar do trem está longe, galáxias à frente. A mochila nas costas está pesada, a maleta preta, "feita da melhor fibra de carbono no mercado", como disse o vendedor, te puxa para baixo pela mão direita.
O passageiro ao seu lado dá passagem, "Estação Dom Pedro II, saída pelo lado direito do trem", diz a voz metálica. Só mais uma estação, e chega de CPMF do banco, chega da conta da Internet, chega de "caralho! Como você é imbecil!", chega de Sucrilhos pela manhã, pizza gelada no almoço e comida requentada na janta, chega de "como foi a faculdade?", chega de "em que posso ajudar senhor?", chega de "a sociedade está uma bosta", chega de escada-rolante que emperra, chega de pãozinho frio na padaria, chega de filas e mais filas e mais filas, chega do gosto amargo do dia-a-dia, chega de trânsito, chega de "porra de bicorde que não sai", chega de refrigerante que explode quando está muito quente, chega de "desculpe, foi engano", chega de iogurte com data vencida, chega de alugar filmes já assistidos, chega de "tem uma moeda chefe?", chega de "o que o senhor vai comer?", chega de lençóis azuis, fronha branca e cobertor azul-marinho, chega de pilhas acabando no discman, chega de músicas inconvenientes tocando no Winamp. Chega disso.
"Estação Sé, desembarque pelo lado esquerdo", você fica no meio do vagão e se vira para o lado direito. Coloca a maleta preta - "feita da melhor fibra de carbono no mercado", ria o vendedor - entre as pernas, puxa a mochila para frente. Agora sim, tudo em slowmotion. Você puxa a "melhor porra" de submetralhadora alemã, a MP40. "Ela foi desenvolvida pelos nazis, sabia?", disse o vendedor, "ela é mais lenta que outras automáticas, mas tem uma mira do capeta! Hahaha! Pode perguntar para os judeus!", ele tinha muitas espinhas no rosto e tinha uma barba suja por fazer, a falta de unhas nos dedos da mão direita não ajudavam em sua aparência.
A porta do lado esquerdo abre, as pessoas saem, são as mesmas que dirão depois de algumas horas: "Eu estava lá! Saí alguns segundos antes do cára começar a loucura!", azar o delas. São 7h15 da manhã, mesmo com muitos descendo na Sé, o trem continua lotado. A porta do lado direito se abre. "Arrependam-se, irmãos!"
As primeiras pessoas, executivos, advogados, empregadas e pedreiros nem olham para a submetralhadora na sua mão, muito menos para o surdo "clack" da trava de segurança sendo liberada. "Cuidado na hora de apertar o gatilho! Essa belezinha dá coice feito égua no cio! Hahaha!", diz o vendedor enquanto beija o cano da arma. O dedo indicador da sua mão direita vai até o gatilho, o seu braço vai se levantando, sentindo os quase quatro quilos de criação nazistas.
O primeiro a ver o vulto negro subindo ao lado de seu corpo é o pedreiro, primeiro ele não entende direito, lhe fita com uma cara de "por que eu fui brigar com a minha mulher justo hoje?", então, como se alguém tivesse sussurrado ao ouvido deste trabalhador, ele entende. O rosto se ilumina, se contorce e ele entende. O que sair daquele buraco negro no cano da arma será apenas a mais rápida morte. Ele se vira enquanto abre a boca, cada músculo do rosto cansado se repuxando. Ele grita.
esse texto me fez bem, e isso basta... se vocês não gostarem, ok. critiquem, mas o façam com parcimônia e que sejam contrutivos. vou postar as próximas partes a cada dois dias... se tiverem saco, acompanhem.
[winamp: whirlwind heat - the kick]
postado por caio teixeira às 3:08 AM |